domingo, 19 de novembro de 2006

Loucuras de pai

Há, pelo menos, dois leitores assíduos deste espaço que assistiram ao que vos conto neste post e, porque já estão habituados a determinado tipo de atitudes e taras da minha parte, não contam para a análise que alguns leitores se dedicarão a fazer, nem poderão influenciar a opinião dos demais.

Quem, na sexta-feira, tenha dado de caras, numa das principais estações de comboios que servem Lisboa, com um tipo, com ar meio alucinado, agarrado ao telemóvel a berrar “aahhhhh”, “come tudo, bebé”, “aaahhhhhh”, não se admire.

Não era, nem de perto nem de longe, nenhum tresloucado fugido do Júlio de Matos. Era, isso sim, este vosso interlocutor a dar a sopa à cria.

“Este gajo diz que não, mas está mesmo apanhadinho da marmita”, pensarão alguns leitores.

Nada disso. O que aconteceu foi que liguei para a mamã, para lhe dar conta de que estava atrasado, precisamente na altura em que ela estava a dar de comer à pequena criatura.

Como esta é uma tarefa para a qual, regra geral, são necessárias as duas mãos, a minha mulher pôs o telefone em alta voz, o que intrigou e, sobretudo, acabou por ser um entretenimento para a bebé que, diga-se de passagem, estava algo renitente em degustar o jantar e passou, ao ouvir a minha voz, a abrir a boca para palrar comigo ao telefone, levando, de caminho, com uma colherada de sopa pela goela abaixo cada vez que o fazia.

Aqui faço um parêntesis para dizer que do mal o menos, porque comigo a coisa ainda era pior e o sénior teve que andar com a minha pessoa montada em cima dum burro, à volta duma nora, enquanto a senhora minha mãe me enfiava a tal colherada de pápa pela boca dentro cada vez que passava por ela.
Por isso, acredito que esta coisa de transformar o telemóvel num entretém enquanto a cria come nem é muito mau.

Ora, à semelhança do que pensaram alguns leitores, quatro ou cinco parágrafos atrás, também três ou quatro pessoas, que se encontravam na gare e sorriam ao testemunhar a ocorrência e a minha figura ridícula, deverão ter pensado que eu não estava nada bem da carola.

Pois desenganem-se e fiquem sabendo que, além de que existem coisas que um pai quase se vê obrigado a fazer em prol da descendência, a coisa até deu resultado, já que a cria comeu a sopa toda!

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